Não se fala em outra coisa, não se escreve sobre outra
coisa. Em cada esquina da cidade, desde as salas de aulas às rodas de bar,
todos discutem sobre os protestos, os manifestos que tomaram conta das ruas em
todo Brasil.
A minha casa não ficou fora desse cenário. A minha filha de
15 anos, há algum tempo, demonstra o seu descontentamento com os rumos do país.
Nesses dias, ela se transformou em uma jovem revolucionária, pintou o rosto com as cores verde e amarela, fez um cartaz com o trecho da música do seu novo ídolo, Gabriel Pensador, que dizia:
“Até quando você vai ficar mudo? Muda que o medo é uma forma de fazer censura
Apesar dos meus insistentes conselhos e previsões aterrorizantes, ela e as amigas foram ao protesto, aos gritos, clamando às pessoas: - Vem pra rua! Vem pra rua!
Depois a minha filha me contou que chorou de tanta emoção. E aí quem se emocionou fui eu.
“Até quando você vai ficar mudo?”
Que pergunta mais impertinente dessa menina, não é?
Eu ainda tentei consolá-la dizendo que o Brasil está melhor
do que há alguns anos, comparando o regime democrático à ditadura e, por fim,
em um golpe baixo, lembrando que ela não anda de ônibus todos os dias, que é
uma jovem classe média com uma vida muito boa!Sabe o que ela me respondeu?
- Não estou lutando por mim, mas pelo meu país. Não é possível que o povo continue aguentando calado toda essa corrupção, enquanto aguarda morrer nas filas dos hospitais.
E continuou:
- Estou preocupada com o meu futuro também. Uma colega minha
estudou muito e conseguiu entrar em uma faculdade pública e agora está de volta
porque os professores estão em greve. Isso também vai acontecer comigo? Lembrei a ela de quando me vesti de preto e fui à passeata da Avenida Paulista gritando – Fora, Collor! E, hoje, ele é senador, como assim?
- Quer dizer que não adianta lutar? Foi aí que você ficou
muda?
Esses jovens tem respostas para tudo (ainda bem!). Estava lendo hoje um texto do humorista Helio De La Penã, do Casseta & Planeta, aonde ele fala que quando era um jovem acreditava no estereótipo do bem e do mal.
“O mal era a direita e o bem era a esquerda. A esquerda podia fazer qualquer cagada, manipular opiniões, até desviar verbas pela causa. Os fins justificam os meios, diziam as lideranças progressistas”.
“Enfim, a esquerda conseguiu chegar ao poder e o que se viu foi a maior sequência de escândalos e corrupção da história do país”, lembra De la Penã.
Mas, peraí, estamos falando de um partido da esquerda? Qual, mesmo?
Para os jovens, como a minha filha, desde que ela tinha 5 anos, o PT governa o país. Ela não lembra, e nem poderia ser diferente, que o PT surgiu com a proposta da mudança, não se lembra da inflação galopante e nem mesmo de como era antes da bolsa- família.
Os absurdos acontecem desde antes do PT chegar ao governo, isso é verdade, mas estamos falando de 10 anos atrás, o que para os jovens não quer dizer nada.
O que eles e todos nós estávamos vendo, como ressalta De La Peña, “é o Marcos Feliciano na Comissão dos Direitos Humanos, Renan na presidência do Senado, Genuíno, condenado, eleito e legislando sobre a ação do judiciário, estádios bilionários construídos em cidades sem time de primeira divisão, estatística maquiando nossa realidade...”
Mentiras se repetiram, inimigos chegaram a acordos para permanecerem no poder...
Onde isso vai dar? Já li em algum lugar que agora o que importa é que o povo achou o caminho, no caso, as ruas. Mesmo assim, insisto em olhar o futuro.
Qual é o próximo passo? A vontade é tirar todos do poder, exceto o presidente do Superior Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.
Da minha parte, ficaria tremendamente decepcionada se ele aceitasse concorrer a um cargo político no Executivo. Eu me sentiria como parte de uma massa manipulada por interesses maiores.
O Joaquim Barbosa, com a sua história de vida, inspira os jovens a lutarem por um futuro melhor, espero sinceramente que ele demonstre ser digno de todo esse prestígio.
Mas, em algum momento vamos precisar confiar em alguém, não é mesmo?
Espero que até as próximas eleições apareçam novos líderes, não apenas novos partidos.
Que a chama acesa no coração do povo não apague por míseros trocados e pelas mesmas promessas não cumpridas.
Sinto que a música do Renato Russo fala para os jovens da minha época, assim como a música do Gabriel Pensador cala fundo na juventude de agora:
“Somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. A ditadura acabou, mas por alguma razão ela permaneceu dentro de nós, uma herança que eu e os meus amigos recebemos dos nossos pais. Isso explica o nosso silêncio.
Espero, acima de tudo, que os jovens de hoje não façam o mesmo que nós, que não desistam e não fiquem mudos.
Prefiro o excesso de liberdade, a escassez de sonhos.
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