quinta-feira, 25 de junho de 2015

Se eu tivesse uma terceira chance...

Eu já tive a minha segunda chance e faz algum tempo, mas não estou convencida de ter feito a escolha certa.

Optei pelo que considerei mais seguro na época, uma cidade pequena (outra vez!), um emprego que me desse segurança (outra vez!) e, veja que impressionante, eu cheguei exatamente ao lugar onde já estive.  

Como poderia ser diferente, não é? Seja como for, eu estou esperando na fila dos desejos a minha terceira chance de fazer tudo novo de novo.  

Fila de desejos não é a fila de necessidades, ou seja, eu preciso mesmo esperar.

Às vezes eu simplesmente fecho os meus olhos e me afasto por alguns momentos dessas manhãs cinzentas e frias, dessas quintas-feiras de outono, onde tudo é tédio ou tristeza.

Eu me desloco até a porta de um café em Paris. A manhã está radiante e eu estou pensando se devo sentar e pedir um cafezinho ou se peço logo um emprego como garçonete.

Eu poderia trabalhar ali e ser feliz. Todas as manhãs, antes do início do expediente, eu ficaria observando a rua, com um cafezinho nas mãos, torcendo para que o primeiro cliente fosse uma pessoa ensolarada.

Nós falaríamos do trânsito horrível na Champs- Élysées, de como os macarrons na Ladurée estavam cada vez mais cosmopolitas e menos tradicionais, com suas receitas amalucadas, apesar de continuarem incrivelmente deliciosos.

E, nesse papo açucarado, teríamos que reclamar da invasão dos chineses pelas ruas de Montmartre, mas antes de nos despedirmos, com um sorriso disfarçado nos lábios, nós teríamos a certeza de que o dia seria perfeito.

Os nossos pesares seriam perfeitamente aceitáveis por nós.
Enquanto eu recolhia as xícaras, eu poderia ver outro cliente entrar no café. Pelo jeito de se vestir e as olheiras embaixo dos olhos, eu estaria certa que se tratava de um artista.

Eu estava certa, era um escritor ainda desconhecido e, através de suas idéias ainda nebulosas, ele alimentaria o meu dia com histórias sobre um novo mundo, me faria rir com uma ideia louca e, ao ir embora, eu sentiria que aprendi com ele sobre um jeito diferente de viver.

E, no finalzinho deste dia, uma moça loira e com batom vermelho também entraria no café. Com os olhos brilhando, eu poderia ver que ela não conseguia disfarçar a ansiedade. Talvez esperasse encontrar alguém?, eu pensaria.  

Ela escolheria uma mesa no canto e ficaria um tempo olhando ao redor, antes dos seus olhos me procurarem e pedir um café.

Eu levaria o café até ela e me afastaria para observá-la. Não demoraria muito para um jovem sentar ao lado dela e os dois começarem a se beijar. Seriam beijos apaixonados, escandalosos e inadequados. Eles só parariam para tomar um fôlego e depois tudo recomeçaria.

Eu afastaria os meus olhos daquela cena, me sentindo um pouco intrusa, para que o amor contido naquele beijo pudesse se espalhar por todos os cantos do café, da rua, da cidade e do mundo. 

Ah...como seria bom! Eu pensaria.

E daí que o amor possa inconveniente ou inapropriado? O amor é o que é.

E, com isso em mente, no final de mais um dia, eu estaria ansiosa para voltar para casa e beijar muito o meu marido e os meus filhos.

Antes ainda daria uma volta no carrossel de Montmartre, subiria correndo as escadas da Basílica de Sacré Coeur (ufa!) e lá de cima soltaria o meu cachecol na esperança de que outras pessoas pudessem ter uma terceira chance de recomeçar...

Uma pena que isso seja apenas um devaneio, eu ainda aguardo na fila dos desejos a terceira chance de recomeçar a vida em outro lugar.

De tanto imaginar como seria, eu às vezes chego a me conformar com um futuro imaginário. A imaginação não machuca, não abandona e não sente fome e não tem limites.

Talvez eu esteja sendo protegida de mim mesma. Talvez eu seja uma sonhadora perigosa, kkk.  


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