Por Sonia Lopes
Diário da Sônia - De Granja Moreruela a Santibáñez de Valdeiglesias
Diário da Sônia - De Granja Moreruela a Santibáñez de Valdeiglesias
Dia 26 - Granja de Moreruela - Benavente - 31,5 km
Que dia intenso!! Tipo montanha russa. Foi duro me despedir
dos peregrinos que foram pelo caminho Sanabres.
Achei que estaria sozinha pelos 4 dias finais da via de la plata até
Astorga. Mas me sobrou um holandês
maluco para fazer companhia.
Trecho fantástico hoje. Pouco usado pois pouquíssimos peregrinos vão para
Astorga. Muitas das setas estão
encobertas pelo mato, e em algumas partes mal se vê o caminho. Fiquei
agradecida pela companhia.
Aquele tempinho de chove e pára continua por aqui,
atrapalhando a vida de peregrino. Mas
até que passou rápido.
Lento foi atravessar a periferia de Bonavente. Sinalização péssima na estrada da cidade para
variar. E chegando ao albergue que fica na saída, havia um impresso avisando
que as chaves estavam na oficina de turismo. Cadê a oficina? ? Ô vida dura. Lá
fomos para o centro monumental. Uma subida atrás da outra até chegar na
catedral. E nada da oficina. Depois de 30 km cada passo é custoso. Perdi o
holandês de vista... começou a chover de novo... ai meu Deus!
Olhei para cima
e... Hostal Universal. Demorô! Deixa o albergue todo para o holandês que eu vou
ficar por aqui. Amanhã é certo que nos
encontraremos ou no caminho ou no próximo albergue. Tem banheiraaaaaa! Me
afundei na água quente por 1 hora e depois fui conhecer a cidade.
Me avisaram no hostal que poderia conhecer o Parador. Hotel chicão que funciona no castelo. Tirei
onda no bar que fizeram em uma das torres bebendo um vinho.
E no bar, fiquei sabendo que havia menu para peregrinos no
restaurante 5 estrelas! Nooooooooó! Imagina se eu iria perder essa. De sandálias
havaianas com um pouquinho de barro nas barras da calça (a outra estava secando
no hostal), entrei no salão espetacular com aquele passinho característico de
peregrino... e jantei sozinha como uma rainha no meio da granfinagem.
O Menu
tinha assinatura. Em outros tempos, ou compraria uma roupa para jantar lá, ou
só iria se tivesse companhia, ou ficaria constrangida. Meu Deus, como eu era
besta.
Dia 27 - Benavente -
Alija de los Infantados - 20,6 km
Acordei tarde... 8:00hs. Como o trecho era curtinho, esperei
abrir algum bar para tomar café antes de sair. Dia lindo, sinalização boa, um
único bar (medonho) em uma vila no meio do caminho.
Caminhei um pouco tensa hoje. Não vi nenhum peregrino e
apertei o passo.
Quase na entrada de Alija senti uma fisgada na face externa
do tornozelo esquerdo. Ainda bem que o
albergue estava próximo. Mas, me preocupou bastante. Dorzinha suportável, porém
pode significar encrenca. Das grandes.
Reencontrei uma peregrina alemã que não via há mais de 20
dias! Ela me emprestou uma pomada de Voltarem. Tomei um comprimido, fiquei
deitada um pouco, mas a fome venceu o medo e fui procurar um lugar para comer.
A Marlies me viu saindo e foi junto... tipo apoio moral
muito frequente entre peregrinos. No caminho havia uma farmácia... o
farmacêutico garantiu que passando a pomada, amanhã eu estaria boa para andar.
Mais uns passos e encontramos outro peregrino que nos mostrou a igreja e as
ruínas de um castelo. Algumas risadas e fotos depois, meu tornozelo estava
incrivelmente melhor! É... Como o psicológico interfere. Impressionante.
Vou aproveitar o wifi do restaurante e finalizar meu diário
aqui mesmo. O albergue é bem isolado, não tem wifi por perto e quando voltar
não sairei mais. Fui.
Dia 28- Alija de los
Infantados - La Bañeza - 23 km
E a alegria de acordar sem dor? Confesso que fui dormir com
medo. Já pensou ter que parar no finalzinho da via?
Saímos eu e a Marlie rumo a La Bañeza sabendo que haveria 2
pueblos onde poderíamos parar para descansar e coisa e tal.
Lindos pueblos e lindos caminhos. Mas nada é perfeito,
né? Lá pelas tantas... terço final, o
caminho nos jogou em um lindo campo florido que se transformou em um charco
fedido e sem sinais.
O mato tampava tudo! A tortura levou mais de uma hora.
Molhei as botas. E molhar as botas significa bolha! Cheguei nesta linda cidade
fedendo que nem gambá. Já lavei as
roupas, as botas, passei na farmácia, agora estou esperando a comida no
restaurante e aproveitando o wifi.
Amanhã acabo a Via de la Plata em Astorga. Durmo lá e pego
um buzão para León onde me encontrarei com minha amiga Anna Maria, para
seguirmos juntas hasta Santiago pelo Caminho Francês! Eita que já passei da
metade!!!
Dia 29 - La Bañeza -
Astorga - 25km
Último dia de Via de la Plata...
Saímos eu e minha amiga alemã, as 7 horas para escapar do
sol que já se faz sentir. Tudo lindo e maravilhoso! Nada de dor. Sinais claros. Os bares e cafés
ainda estavam fechados.
Andamos uns 4 km e o caminha ficou sem graça... plantação
enorme de batatas quando de repente aparece do nada uma casa rural perdida.
Entramos, lógico. O lugar era
lindoooooo! E nos serviram um café da
manhã magnífico por 3€.
Inacreditável. A via
é assim. Um campo florido se transforma em um banhado fedorento. E uma
plantação de batatas em um lugar super acolhedor com um big café da manhã.
Atravessamos um lindo parque de mais ou menos 10 km sem
problemas. Coisa linda! A Marlies resolveu dar um tempo em uma sombra e
combinamos de nos encontrar no próximo pueblo 8km à frente.
Me perdi!!! Cara...
não acreditei. Não via mais sinais... putz! Continuei andando... Cheguei a um
pueblo depois de 2 horas e perguntei onde estava. Estava longe. Resumo: andei 8
horas até chegar a Astorga. Estava tão
por fora da rota que só descobri que era Astorga quando estava dentro da
cidade.
Ô viazinha difícil! Fui direto à Catedral. Encontrei minha amiga e vamos nos despedir.
Amanhã ela segue para Rabanal del Camiño e eu vou de bus para León.
A Via de la Plata foi uma montanha russa de emoções. Um leque de situações inesperadas. Exercício de paciência. Teste de resistência
e isolamento. Tive raiva do descaso com
os sinais em várias situações que me tiraram do sério.
Escolho guardar as lindíssimas paisagens, as cidades
romanas, os caminhos ensolarados, o estar sozinha nas tormentas e me sair bem,
os inesquecíveis companheiros e os campos floridos. Mas, sabendo que o pântano
fedorento existe. E é importante prestar atenção aos sinais.
Dia 30 - Astorga - Lión ( ônibus )
De hora em hora, conforto e rapidez por 3€. Mas que sensação edtranha olhar pela janela e ver
peregrinos... impressiona a enorme quantidade.
Neste trecho, o caminho é quase todo ao lado da
"carretera". É muita gente nesse caminho francês. Ô lôco.
Chegando ao albergue Santa Maria de Carbajal Benedictinas,
expliquei que havia concluído a Via de la Plata desde Sevilha até Astorga, e
que vim de ônibus para León.
Disseram que não havia problema e que eu poderia
ficar aqui por até 3 dias. Chiqueeee!
(confesso que senti uma pontinha de orgulho. Ninguém é perfeito!)
Agora é esperar a Anna que deve chegar amanhã...
Dia 31 e 32 - León -
Villadangos del Páramo - 22km
No trigésimo primeiro dia do Caminho de Santiago eu fui uma
turisgrina. Primeiro pq minhas novas colegas peregrinas precisavam de ao menos
um dia para se recuperarem da longa viagem do Brasil até aqui. Sim... duas pq a
Cláudia, minha irmã, que havia desistido da peregrinação, veio de surpresa com
a Anna Maria.
O hospitaleiro aceitou que elas passassem duas noites no
albergue. Fiquei tão eufórica que mal dormi! E segundo pq eu precisava de um
refresco depois da via de la plata. Ontem passeamos e compramos o equipamento
que ainda faltava.
Hoje pegamos o caminho cedinho! Gostei muito de apadrinhar
as duas com as vieiras e ajudar com os ajustes das mochilas e cajados. Sensação
muito boa poder colaborar com esse momento delas. Curti!!
Dia nublado e perfeito para percorrer a etapa que poderia
ser de 7,5 ou 22 km. Primeiro dia... pique total.
Quando chegamos aos 7.5, perguntei se queriam enfrentar os
22 e vieram sem chiar até Villadangos. Pudemos parar duas vezes... lanchar,
tirar as botas, papear...
O senhor Agapito, figura folclórica do Caminho Francês,
estava lá oferecendo regalos para os peregrinos. Nem vi o tempo passar. Foi uma
delícia!
Estamos no albergue municipal. As duas já se comportam como
velhas peregrinas. Lavaram as roupas, se
viraram.
A Claudia até cozinhou e a Anna fez acupuntura no próprio joelho!
Sussas e de boa. Daqui a pouco um rolê pelo centro... Mas já preparei o espírito delas para as
dores que terão amanhã...
Dia 33 - Villadangos
del Páramo - Santibáñez de Valdeiglesias - 16km
Saímos por volta das 7:00 e a primeira parte do caminho não
era lá muito interessante. Chuva ameaçando sem cair... e uma trilhazinha ao lado
da auto estrada com tráfego intenso.
Lá pelas tantas a Cláudia começou a apitar por causa dos
caracóis (ela tem pavor) que são muito comuns aqui na Espanha. Estes aqui até
que estão pequenos. Imagina se ela visse
aqueles grandões negros que chapiscam as trilhas em outros pontos!
Vixe! Foi um custo impedir que ela fosse pelo acostamento
(espaço preferencial dos bicigrinos) mas passou logo e seguimos tranquilamente
por uma caminho sem caracóis. Ufa!
Na sequência passamos por Hospital de Órbigo e entramos em
um espaço maravilhoso daqueles cuidadosamente preparados para fazer qualquer
peregrino esquecer os tropeços. Almoçamos e seguimos pq ainda era muito cedo
para parar.
Dividimos este trecho que seria de 28 km em 2 pq acho demais
para as duas. Se bem que estão tirando de letra... sei que podem mais. Mas,
temos tempo... para que correr?
Todas sorridentes e sem bolhas. Se aparecer alguma será nos
dedos das mãos de tanto tirar fotos! Eita! Rsrsrsrs
Amanhã Astorga de novo! Já estou ficando conhecida lá...
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